O Rosto por Detrás da Face ou a Imagem Imaginante / The Visage Behind the Face or the Imagining Image

CADERNOS IMAGENS DE PENSAMENTO #2

O Rosto por Detrás da Face ou a Imagem Imaginante
Texto: João Barrento

Imaginemos duas imagens díspares, unidas de forma a que se produza um contraste e nasça uma nova imagem. Assim descreve Alexander Kluge a montagem, tal como é entendida por Eisenstein e Godard. No ponto de intercepção, na diferença, no que não se vê, surge uma terceira imagem. No confronto de duas improbabilidades, revela-se um pedaço de vida. Walter Benjamin fala-nos de uma experiência marcada pelo corte, pela simultaneidade, pela dissonância, de um novo tipo de percepção. A Benjamin se deve o título deste ciclo de conferências: “Imagens de pensamento”. Imagens que provocam um choque, que libertam chispas que iluminam repentinamente o familiar. Imagens dialécticas, súbitas, impossíveis de reter. Imagens que se perdem no preciso instante em que aparecem. Configuração e síntese de diferentes tempos históricos, estas imagens rompem a continuidade, revelam-se quando o tempo se detém numa suspensão momentânea. Fulgurantes, iluminam a história, abrem ao conhecimento domínios que lhe pareciam vedados. Num instante, a coisa aparece por si mesma como evidência do que não se pode deduzir, evocação alegórica do que não se pode dizer por palavras. Em San Gimignano, um breve texto integrado num conjunto intitulado precisamente “Imagens de pensamento”, escrito na órbita de Rua de Sentido Único (1928), Benjamin diz-nos: “Encontrar palavras para aquilo que temos diante dos olhos é qualquer coisa que pode ser muito difícil. Mas quando chegam, batem com pequenos martelos contra o real até arrancarem dele a imagem, como de uma chapa de cobre”.

Este ciclo de conferências e os cadernos que delas derivam emanam da tentativa de resgatar experiências ameaçadas num presente incerto, de captar as trepidações do presente, as emoções e experiências que vibram nas margens. Trata-se de unir o discursivo e a imagem, confrontá-los, reconhecer o potencial de uma imagem, de um fragmento. Abrir um espaço para pensar as imagens e através das imagens. Sem rede, nestes tempos difíceis, olharemos para a história, com Benjamin e tantos outros autores e autoras, como essa “constelação de perigos” que, sempre alerta, devemos evitar. Evocaremos a urgência de um pensamento crítico, para que a história não siga o seu curso avassalador. Remexendo nos desperdícios do passado, cheios de possibilidades por cumprir, trata-se de evitar que o futuro seja um mero prolongamento do presente ou, nas palavras de Benjamin, de puxar o travão de emergência da locomotiva da história.

 

autor/a
ano de publicação 2023
idioma PT, ENG
n.º de páginas 80
editora
género: Arte, Ensaio

5,00 

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